quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Man Ooman - Dancehall jamaicano



Neste feriado estava em BH e pude ir ao festival de cinema Indie no Cine Belas Artes. Escolhi, não por acaso, o documentário Man Ooman dirigido pelo dinamarquês Andreas Johnsen. O filme é sobre o Dancehall, estilo de dança das periferias jamaicanas, principalmente dos grandes centros urbanos. A dança é uma espécie de simulação sexual em que o homem e a mulher (man and ooman como diriam os jamaicanos) se agarram em diferentes posições: sobre os carros, pendurados em árvores ou em grades, deitados no chão e onde mais as capacidades acrobáticos dos dançarinos permitirem.
Além da genialidade e criatividade das periferias que tanto me agradam, outra coisa me chamou atenção ao assistir o filme: o público do cinema, especialmente os homens, se escandalizavam e se derretiam em gargalhadas ao ver as diferentes posições em que os dançarinos se colocavam. No mesmo momento pensei no atributo narcisista que compõe a civilização ocidental: “é feio tudo que não é espelho”. O riso, em alguns casos sinal de regozijo e comunhão, em outros representa aversão e deboche. Aquele riso do cinema diz respeito a esta segunda natureza.
Uma socióloga jamaicana entrevistada no documentário se pergunta em um preciso momento: “gostaria de entender porque tudo que o negro produz nunca é bom?”. Além disso, mostra como a pista de dança do dancehall é um espaço de valorização da mulher negra, na medida em que ela ganha visibilidade e atenção quando consegue executar movimentos chamativos. Ao contrário da estética ocidental em que mulheres gordas com lábios fartos e seios grandes não são cultuadas, o espaço do dancehall é um espaço de respeito à mulher negra das periferias jamaicanas, e não de violência e vulgaridade desmedida, como aparentemente entenderam aqueles telespectadores.
Para os conservadores e feministas ocidentalizadas, o dancehall vulgariza o sexo, além de assegurar um papel da mulher como objeto sexual. Mas vale ressaltar, que se na pista de dança a mulher é simuladamente fodida por vários homens, ela não foi retirada de casa contra sua vontade. Essa é uma evidência de que o dancehall possui valores próprios de socialização e significação da vida, distantes e contraditórios com os valores ocidentais-burgueses-brancos.
Por último, para contraria os críticos do dancehall, vale mencionar a resposta dos dançarinos do grupo Federation ao serem questionados sobre porque não levam as mulheres pra casa de uma vez e transam com elas, ao invés de simularem isto na rua: “mas o dancehall é uma dança. Se eu danço com uma mulher isso não significa, necessariamente, que eu quero transar com ela”.
Man Ooman é o documentário que mostra a evolução da música jamaicana, os conflitos sexuais enfrentados por uma sociedade machista e, sobretudo, uma forma de organização peculiar do negro pobre, com toda sua força de organização popular.
Nenhum pensamento ficou mais forte em mim ao final do filme que este: “preciso dançar mais o funk carioca”.
Vida longa às manifestações da periferia! Vida longa ao Dancehall!
Segue o link do trailler, tchuzeiros. Vale a pena conferir o material.
http://www.youtube.com/watch?v=0-RnbWdsr5E

Um comentário:

  1. Uma experiência questionadora. Sendo mulher, especificamente provocadora... Existe medida para a explicitação sexual? Atravessar um suposto limite é a banalização do sexo? Ou pensar na existência dessa banalização é ser moralista?
    No dancehall, onde o prazer dos dançarinos se concentra no olhar admirador do público, o corpo feminino é mais uma expressão do domínio masculino?
    Bom, são perguntas deslocadas.
    O que eu ia dizer é que o documentário é uma boa oportunidade para conhecer um pouco mais da cultura jamaicana e se deliciar com ela.
    A desenvoltura do corpo negro, como sempre, é admirável (e invejável!).
    Sobre a reação dos espectadores, acredito no "riso perplexo" como expressão da provocação individual - aí outra função da arte. Não descarto uma possível ingenuidade da minha parte, mas ainda assim, priorizo o incômodo à indiferença.

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